por Ana Helena Tavares, jornalista, conselheira da ABI
Em locais rodeados pela natureza, as vítimas fatais da Covid-19 estão podendo se eternizar. Isso graças à campanha “Bosques da Memória”, que tem como objetivo restaurar o ecossistema plantando uma muda de árvore para cada um dos mortos pela doença. No último sábado, 20 de fevereiro, jornalistas foram homenageados em um bosque reservado à categoria, localizado na fazenda da Associação Mico Leão Dourado, em Silva Jardim (RJ). Um deles foi Jesus Chediak, que foi por muitos anos diretor da cultura da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e amava esta entidade.
A viúva de Chediak, Glória, e a filha, Paloma, plantando a espécie Ingá Banana
A jornalista Cristina Serra, conselheira da ABI e uma das responsáveis pelo projeto, e seu marido Luís Paulo Ferraz, secretário executivo da associação, receberam a família Chediak, a viúva Glória e a filha Paloma, e explicaram o projeto. “Quando a gente começou, a gente falava em 200 mil (vítimas da Covid). Hoje, já passamos de 240 mil, mas nossa meta ainda é 200 mil”, esclareceu Luís Paulo. “É uma forma de tentar trazer algum conforto para as famílias. E o meio ambiente ano passado também sofreu muito com queimadas e tudo mais, nessa tragédia que esse país vive. Então, tem sido uma mobilização muito bonita. Não é o plantio de uma árvore na calçada, importante também por conta de urbanização urbana. Mas aqui é um projeto maior. É uma reconexão entre florestas”, completou ele.
“A gente quer que as famílias saibam que seus entes queridos estão aqui sendo homenageados e renascendo em forma de vida e de esperança, que é o que uma árvore representa, dentro de um bosque que vai se encher de animais e ele vão viver ali, vão se multiplicar, vão se reproduzir. E aqui, especificamente, o bosque da associação tem o sentido maior de salvar uma espécie (o mico leão dourado) da extinção”, comentou Cristina Serra.
A “reconexão entre florestas“ a que Luís Paulo se refere é entre a Reserva de Poço das Antas, que fica de um lado da BR101, na altura de Silva Jardim, e a fazenda da Associação Mico Leão Dourado que fica do outro lado da rodovia e, em breve, será transformada em parque ecológico aberto à visitação. Após muita pressão de ONGs, foi construído um viaduto para passagem de animais, especialmente micos leão dourado, de um lado para o outro. As árvores plantadas para as vítimas de Covid são frutíferas justamente para alimentar os micos e seus companheiros de mata.
No mesmo dia em que Jesus Chediak ganhou um Ingá Banana, outros jornalistas ganharam outras árvores: José Silveira foi contemplado com um exemplar de Ipê-Amarelo do Brejo, Letícia Neworal Fave, Siglia Zambarelli Doria, Waldir Alves de Carvalho e José Itamar de Freitas ganharam um Guanandi.
A campanha “Bosques da Memória” é capitaneada por três redes de ONGs e adotada pela ONU como modelo. A ideia de fazer um bosque para a categoria dos jornalistas, que já perdeu 95 vidas para o coronavírus até o final de janeiro, foi concebida a partir de uma parceria entre a Associação Mico Leão Dourado, a ABI e a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ).
A seguir, depoimentos da viúva e da filha de Jesus:
Por Glória Chediak (viúva):
“Jesus amava a Natureza! Adorava os animais! Quando a jornalista Cristina Serra me falou sobre a homenagem e me convidou para o plantio da árvore, no Bosque da Memória, fiquei emocionada e pensei : não existe melhor lugar para eternizar o nome do Jesus! Lembrei de nossas viagens à sua amada Minas Gerais, quando ele sempre exaltava e se deslumbrava com a natureza. Nesse período tenebroso de nossa história, em que vivemos uma total inversão de valores – é muito maior o incentivo para cortar árvores de que para plantar – esse ato é quase revolucionário, uma redenção do ser humano. E bem do jeito que ele gostaria, Jesus vai estar vivo num bosque, junto a natureza e em companhia dos animais que ele sempre amou e cultivou!”
Por Paloma Chediak (filha):
“Ainda angustiada por uma pandemia que foi pessoalmente dura com minha família, tivemos a oportunidade de homenagear meu pai com o plantio de uma árvore num bosque chamado “Memória”. Toda oportunidade de prestar homenagem ao meu pai é um respiro em meio a essa ainda árida realidade. E em termos tanto de arejamento quanto de beleza de tributo, nada melhor do que o cenário escolhido ser um bosque. A simbologia de fazer meu pai presente através de uma árvore o faria especialmente feliz por ser um amante da natureza. E uma árvore em plenitude com outras árvores, também plantadas em deferência a outras vítimas, me faz lembrar uma frase que ele gostava muito “é o boque que protege a árvore” – metáfora da importância do amparo social sobre o indivíduo. Agradeço mais uma vez a Cristina Serra pelo convite e a todos idealizadores e colaboradores do projeto. Parece que ele faz parte de um projeto maior que é a década de restauração do nosso ecossistema (2021-2030) declarada pela ONU. Mais um sinal que foi uma homenagem mais do que certeira por meu pai ter deixado como um de seus principais frutos nesta vida o ideal de reconstrução de um mundo melhor. E com certeza esse mundo em seu imaginário tinha muitas vivas e frutíferas árvores.”
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